O nome de Álvaro de Campos, atribuído a esta biblioteca, prende-se com o facto deste heterónimo de Fernando Pessoa ter nascido em Tavira, como refere o próprio na carta que escreveu a Adolfo Casais Monteiro, onde explica a génese dos heterónimos:
“(…) Álvaro de Campos nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890 (às 1.30 da tarde, diz-me o Ferreira Gomes; e é verdade, pois, feito o horóscopo para essa hora, está certo). Este, como sabe, é engenheiro naval (por Glasgow), mas agora está aqui em Lisboa em inatividade. (…)”
“Álvaro de Campos, é assim um poeta de Tavira, cidade onde passou a sua infância, cidade refletida nos seus poemas.” ( in Lopes, Teresa Rita – Álvaro de Campos o engenheiro de Tavira. “Tavira”, (17), Janeiro de 2006).
“Ao criar Álvaro de Campos (…) Fernando Pessoa deu forma de gente aos seus medos e anseios ao mesmo tempo. Ousou, através dele, os gestos e os sonhos e as viagens e os excessos que o seu temperamento confessadamente abúlico lhe não permitiu viver. (…)
Um poema de 1930 permite-nos assistir ao crescimento do menino nas suas sucessivas fases, desde criança, no colo das tias, até ficar homem, engenheiro, na Escócia e já cansado de aí estar. Vemo-lo, primeiro, feliz mas inconsciente da sua felicidade, na casa-colo das tias de que em breve seria apeado: surpreendemo-lo, em seguida, “errante na casa das ‘tias já mortas’. É uma dessas tias que, na Ode Marítima” lhe cantava o romance da “Nau Catrineta” para o adormecer, na casa da sua “infância ao pé do rio” Gilão, assim se chama o rio que atravessa Tavira.
À procura de si, desse passado, o vemos desembarcar na sua cidade natal, num poema intitulado “Notas sobre Tavira” (1931), em que confessa: “Paro diante da paisagem, e o que vejo sou eu”.
É evidente que não foi por acaso que Pessoa fez nascer Álvaro de Campos nesta cidade algarvia, berço de seu avô general, Joaquim António de Araújo Pessoa, e de seu tio Jacques Cesário de Araújo Pessoa, também militar de profissão.
Durante a sua estadia em Lisboa, entre 1901-02, o jovem Pessoa residindo então com a família em Durban, na África do Sul, deve ter tomado consciência, só então, de quem eram esses seus antepassados de que mais tarde, ao regressar definitivamente a Portugal, desenhará o brasão.
Numa nota autobiográfica que redigirá disse-se “descendente de fidalgos e judeus”, pensando com certeza nesses Pessoas, cuja origem remontava até ao início da nacionalidade. (…)
Depois de regressar definitivamente a Portugal, em 1905, Pessoa visitava com alguma regularidade a família de Tavira, sobretudo a tia Lisbella (da Cruz Pessoa Machado), que residia no Largo da Alagoa, hoje nº 40, mas tinha também, na Asseca, a quinta da Mesquita, e, em Monte Gordo, “também possuiria propriedade sua”, segundo M. Lucília Lencart, na sua obra “Do Algarve nasceu Fernando Pessoa”, ed. da autora, 1987 (p.150).